Microconto II

Lembro das dormências da mãe, eu filha desacordada de favores. Ela acorda pelo cheiro e percebo no quarto uma réstia de assombração. Rodelas de cebola, um rosto adormecido. O choro é acido. Manchas nos olhos, um tempero que me volta à cozinha. Um buraco no meio dos talheres suja meus dedos: espalmei a mão, quase cortei um dos pulsos. Giro pela casa e a boca do estômago não sorri. Feri minha língua com a faca que não me deram, mas que sabia minha quando as visitas chegavam. Ouço passos, dou meia-volta e vejo duas formigas que carregam os farelos de bolo. Longe do sal, toda janela suporta a maresia. Noite fria, geladeira aberta, fecho a porta.


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